quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Do jeito dela...


Cada vez tenho mais certeza de que todo ser humano tem seus processos bem particulares de aprendizado. Ísis é o maior exemplo disso. Não mostra concentração nem pra comer, só consegue manter a atenção quando faz arte, sua maior paixão. Ama pintura, recorte e colagem, escultura... Mas agora algumas de suas atitudes têm me surpreendido muito. Ela sempre leu muito comigo, geralmente histórias já conhecidas...eu  vou parando onde ela já consegue ler sozinha. Não se atrevia muito a tentar livros diferentes, preferia se acomodar nas palavras que sabe de cor, que não são poucas. De uns tempos pra cá, tudo mudou. Mais precisamente quando notou  que a irmã  não precisa mais de mim para ler os livros que deseja. Agora quer tentar novos livros e às vezes engata um no outro, sem demonstrar cansaço. Novidade para quem não se concentrava em nada. Novidade para quem deixa os deveres da escola sempre incompletos. Ela ainda desanima diante de uma palavra que não domina, é claro. Neste caso eu leio, mas ela tem até tentado arriscar. O processo de alfabetização da Ísis é muito centrado na imagem mental das palavras, as intervenções a  atrapalham imensamente, a deixam insegura... Acho que nunca acompanhei nenhum aluno que fosse assim, ou não tinha olhos de ver ou feeling para perceber, não li as entrelinhas. Ela tem seu estilo. Tem um tempo próprio, um jeito muito particular de  construir conhecimento...  E veio para desestabilizar tudo que eu pensava que sabia. Hoje de manhã eu a flagrei deitada na minha cama com um livro de poemas do Manuel Bandeira que tirou da estante, muito antigo, sem capa. Estava lá, tentando ler um poema sozinha... Quando me viu, pediu ajuda. No entanto, já não estou tão certa de quem realmente precisava de ajuda no momento, se ela ou eu.

Um comentário:

Unknown disse...

Passo por experiência semelhante. Minha filha foi prematura ao extremo.Lutou muito pra estar conosco. Sempre foi muito serelepe. Fez vários testes para ver se tinha hiperatividade.
Passou por vários especialistas (acho que todos).
Sempre lia pra ela desde o ventre.
Ela nasceu ouvindo histórias.
Quando estava no período inicial da alfabetização, teve muita dificuldade para construir o processo da leitura e escrita. Ficava apavorada!!! Fui alfabetizadora, lia pra minha filha, estimulava de várias formas e ...nada!Eu me sentia frustrada!
Percebia que mais que ouvir, ela gostava era de inventar ou reinventar a história ouvida. Tinha pressa que eu terminasse logo, não porque não gostasse, mas porque ela é quem queria contar, do seu jeito. E ainda o fazia com toda expressão corporal ( não que soubesse de fato ler o que estava escrito).
Hoje, Malu, Maria Luiza, tem nove anos. É alfabetizada. Está no quarto ano. Ainda tem suas dificuldades, mas já supera sozinha.
É muito criativa! Cria vídeos, canta e compõe.Interpreta personagens (uma atriz)e as inventa
também. Ah...é coreógrafa!Rs
Ela nasceu para as artes.
Estar nos padrões ainda tradicionais do sistema educacional é uma tortura pra ela. Percebo que quer ser LIVRE PARA APRENDER. Mas existem as regras, horários, conteúdos e mais conteúdos...
A escola pra ela (passou por várias) é uma prisão, hoje mais bem aceita. Porém, é em casa que seu mundo desperta com tudo. E vemos o quanto é inteligente!
Como professora e pedagoga tenho aprendido muito com ela. Cada um aprende de maneiras diferentes. Que o padrão não precisa ser o "padrão"!
Seus estímulos são outros. Ela aprende com naturalidade o que lhe dá prazer e forçadamente o que não!
É conflitante. Quantas vezes chorei, puni, por não compreende-la!
Hoje estou em aprendizado, em reconstrução.
Malu, com alma de artista, é sensível, observadora, solidária, companheira. Com ela aprendo o que eu achava o que sabia, o que pensava ser melhor. Graças a ela, hoje tenho um novo olhar como mãe, educadora, profissional e pessoa!